sexta-feira, 19 de abril de 2013

Senhor do Bonfim e a Guerra de Canudos, por José Gonçalves do Nascimento.

*Por José Gonçalves do NascimentoPresidente da Academia de Letras e
Artes de Senhor do Bonfim – ACLASB

jgoncalvesnascimento@hotmail.com
Instalado às margens do rio Vazabarris, em 1893, por obra de Antônio Vicente Mendes Maciel, ou Antônio Conselheiro, Canudos foi, talvez, o maior exemplo de mobilização popular que a história do Brasil já registrou. Em apenas quatro anos de existência (1893-1897), o arraial, que começou com um número de pessoas relativamente pequeno, já era um dos maiores centros populacionais do interior da Bahia, sendo responsável, inclusive, por sua autossustentabilidade econômica. Seu status de sociedade autônoma e insubmissa aos ditames oficiais terminou despertando a ira das elites brasileiras, as quais, em contrapartida, resolveram apelar para o confronto. Assim, tinha lugar a guerra de Canudos. A luta, que durou aproximadamente um ano, mobilizou quatro expedições do Exército Nacional e matou milhares de brasileiros, entre
soldados e adeptos de Antônio Conselheiro.
Ao vasculhar os anais da história bonfinense, deparamo-nos com informações assaz valiosas, acerca da participação de Senhor do Bonfim nos fatos relativos ao episódio de Canudos.
A primeira informação a esse respeito nos é dada pelo ilustre escritor Nertan Macedo (numa publicação dos anos sessenta), tendo como referência os irmãos cearenses Antônio e Honório Assunção – os chamados irmãos Vilanova, como ficariam conhecidos tempos depois. Os dois foram tangidos do Ceará pela terrível seca de 1877/1879, vindo parar na então Vila Nova da Rainha, donde o cognome Vilanova. Antônio era comerciante; Honório, mais moço, era seleiro. Estabelecidos na nova terra, aí fizeram vida e constituíram família.
Certa feita, o cônego Pedro Hugo chamou Antônio Vilanova e disse: “sei que você gosta de mascateação. Vou fazer uma desobriga e você vai comigo. Poderá vender muito pelo caminho.” E se foram, ambos, caatinga adentro. Em Uauá, última etapa da desobriga, Antônio deixa o cura e prossegue viagem até Canudos, unindo-se a um grupo de peregrinos que demandava o “arraial sagrado”. O mascateador gostou tanto de Canudos que terminou ali ficando. De Vila Nova da Rainha, Honório ia despachando a mercadoria que Antônio solicitava, de sorte que Canudos passou a abastecer-se, basicamente, das mercadorias oriundas da então futura Terra do Bom Começo. Tempos depois, a convite do irmão, Honório Vilanova também mudaria para Canudos.
Não demorou muito, e os irmãos Vilanova se tornaram detentores do maior estabelecimento comercial do arraial de Canudos. Isso lhes conferiu considerável prestígio, tornando-os participantes do grupo das pessoas com maior influência no séquito conselheirista. Antes de findar a guerra, e com o consentimento de Antônio Conselheiro, os dois voltariam para o Ceará, levando boa parte da fortuna que conseguiram amealhar.
Outras informações dignas de nota dizem respeito à fase da guerra, propriamente dita, e têm como responsável o escritor bonfinense Lourenço Pereira da Silva, no livro Memória Histórica e Geográfica da Comarca do Bonfim, editado em 1915. Contemporâneo dos acontecimentos que abalaram o sertão da Bahia, no final do século XIX, Silva nos oferece informações por demais valiosas, no que se refere à participação de Senhor do Bonfim na guerra de Canudos.
Vamos aos fatos.
No início de março de 1897, após o fracasso da 3ª expedição, comandada pelo coronel Moreira César, o Conselho Municipal, sob a liderança de João Martins Fontes, emitiu a seguinte nota de pesar: “o Conselho Municipal da cidade do Bonfim, vivamente impressionado pelo insucesso da expedição enviada pelo governo federal para destroçar os fanáticos de Canudos, capitaneados por Antônio Conselheiro (…), deixa consignada aqui a expressão de seu profundo pesar por tão lamentável acontecimento”. O mesmo Conselho votou, no final de março, um projeto do intendente Antônio Laurindo da Silva, que dava a alguns logradouros de Bonfim, nomes de oficiais mortos durante o enfrentamento da 3ª expedição. Pelo projeto, as antigas praças do Campo do Gado e do Reservatório passaram a se chamar Coronel Moreira César, e Capitão Salomão, respectivamente. Já o Coronel Tamarindo batizou uma rua que surgia atrás da praça Dr. José Gonçalves. A essas manifestações, seguiram-se, ainda, duas missas de trigésimo dia, que a municipalidade mandou celebrar, em sufrágio dos mortos.
Com a chegada da 4ª expedição ao teatro da luta, estreita-se ainda mais a relação de Senhor do Bonfim com a guerra de Canudos. É revelador, neste particular, o fato da antiga Vila Nova da Rainha haver se transformado no principal centro de fornecimento de víveres para as forças legais, “subindo a cerca de dez mil, o número de bovinos fornecidos no espaço de sete meses”.
Concomitante a isso, a filarmônica União e Recreio arrecadou e entregou quase três contos de réis ao Comitê Patriótico da Bahia, uma organização não governamental fundada, na época da guerra, com a finalidade de prestar socorro aos soldados envolvidos no conflito.
Finda a guerra, a cidade de Senhor do Bonfim foi palco de acaloradas manifestações, em comemoração à vitória das forças expedicionárias. Sob os acordes da União e Recreio, diversas autoridades e famílias de Bonfim dirigiram-se à cidade de Queimadas, em trem especial, a fim de aplaudir de perto o comandante das forças em operação, general Artur Oscar Guimarães.
Não menos calorosa foi a recepção oferecida pela população bonfinense ao coronel José Siqueira de Menezes, quando da estada deste em Bonfim, logo após o término dos conflitos. Meneses, um dos militares que mais se destacaram no campo de batalha, foi recepcionado no antigo Hotel Loureiro, onde participou de lauto jantar, promovido em sua homenagem.
Pelo visto, teve Senhor do Bonfim papel significativo nos fatos relativos à guerra de Canudos. Mais: sua participação foi decisiva para que tais fatos tivessem o desfecho que tiveram.


Publicado por Redação Bonfim Notícias em 19 de abril de 2013

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